sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Cão ou gente?

Criação baseada na antropomorfização dos cães pode gerar problemas comportamentais

Cães com roupinha, sapato, perfume e até jóias são cada vez mais comuns nos dias de hoje. Mas será que, ao tratar os animais de estimação como se fossem seres humanos, estamos realmente fazendo bem a eles? Para os cientistas que estudam o comportamento dos animais, pode ser que não. Distúrbios como a Síndrome de Ansiedade de Separação em Animais — maior causa de abandono de cães — podem estar relacionados à forma como os animais são criados.

Em sua pesquisa de doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal da UENF, a médica veterinária Sabina Scárdua buscou estudar padrões de apego entre cães e seus donos para tentar identificar fatores associados ao aparecimento da Síndrome — distúrbio comportamental mais comumente relatado em clínicas veterinárias. Os resultados alertam para o fato de que a forma de criação com apego excessivo pode prejudicar o bem-estar dos animais, gerando ansiedade e estresse.

— Nosso objetivo foi examinar o efeito de características individuais de cães (como sexo, idade, histórico de agressão e reação à saída do dono) e o efeito de características de criação dos cães (como estilo de moradia, companhia de outros animais, local onde dorme, recebimento ou não de punição física, tempo em que é deixado sozinho) no comportamento dos animais — explica.

Segundo Sabina, pesquisas mostram que os padrões de apego dos animais a seus donos são semelhantes aos das crianças por seus pais. Isso é possível observar através do Teste de Situação Estranha, criado em 1980 para estudar o apego em humanos mas adaptado para cães em 1998. No teste — utilizado na pesquisa — um cão e seu cuidador entram em uma sala não familiar e são apresentados a um estranho, para em seguida experimentar três episódios de separação e dois de reunião.

— Tipicamente, o estresse da separação ativa o sistema de ligação que torna o indivíduo estressado e carente para ganhar proximidade e conforto na reunião — explica Sabina.


Sabina e seu cão, que sofre de ansiedade
Orientada pela professora Rosemary Bastos, do Laboratório de Reprodução e Melhoramento Genético Animal (LRMGA) da UENF, a pesquisa mostrou cães que dormem na mesma cama ou no mesmo quarto que seus donos desenvolvem maior ansiedade quando separados deles. Fêmeas e cães mais jovens também experimentam maior ansiedade quando devem ficar longe dos seus donos. A pesquisa mostrou, no entanto, que o fato de o cão ser agressivo não influencia o nível de apego pelo dono, muito menos o fato de o cão morar em companhia de outros cães.

Participaram do teste homens e mulheres voluntários, na faixa de 18 a 60 anos, com diferentes profissões e estilos de criação de cães, junto com cães de ambos os sexos, na faixa de 01 a 14 anos de idade e de 16 raças diferentes.

— É provável que em alguns anos venhamos a discutir de forma mais fundamentada o estilo moderno de criação dos animais de estimação. Com o aumento dos distúrbios comportamentais em cães e gatos, é claramente preciso rever alguns conceitos — afirma Sabina, lembrando que os estudos sobre apego e sua relação com a Síndrome de Ansiedade de Separação em Animais continuam com o aluno Breno Garone, que cursa o último ano do curso de Medicina Veterinária da UENF.

Se você quiser saber mais sobre este assunto, veja o artigo científico Estudo exploratório da síndrome de ansiedade de separação em cães de apartamento, publicado na Revista Ciência Rural em março de 2010.

Fúlvia D'Alessandri

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