quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Capim-elefante: nova cultivar

A nova cultivar tem boa produção e alto valor nutritivo
Após 10 anos de pesquisas, cientistas do setor de Forragicultura e Nutrição de Ruminantes do Laboratório de Zootecnia e Nutrição Animal (LZNA) da UENF comemoram o lançamento de uma nova cultivar do capim-elefante que possui maior potencial de produção de forragem e alto valor nutritivo. Trata-se do BRS Kurumi, resultado da parceria da Universidade com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) e a Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (Apta). 

Colaborador da Rede Nacional de Avaliação de genótipos de Capim-Elefante (Renace), o professor Hernán Maldonado, da UENF, coordena a pesquisa e explica que foram realizadas complexas avaliações de mais de 35 genótipos de capim-elefante, envolvendo nesse trabalho bolsistas de iniciação científica e pós-graduandos em Ciência Animal da UENF.

- O melhoramento genético de forrageiras só é válido após vários ensaios de avaliação dos genótipos sob diferentes condições de solo, clima e manejo – diz.

As pesquisas tiveram o apoio da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). Segundo Maldonado, as vantagens deste tipo de capim estão no seu crescimento vigoroso com rápida expansão foliar, intenso perfilhamento, elevada relação folha/colmo e seu porte baixo.

- O BRS Kurumi possibilita a intensificação da produção animal com menor uso de concentrado. Além disso, o porte baixo facilita o manejo – afirma.

A característica de pequeno porte chegou a batizar o capim: seu nome “Kurumi” significa menino na língua indígena tupi-guarani. Entusiasmado com o resultado positivo do trabalho, Maldonado afirma que o novo “menino” é uma ótima opção para os produtores que almejam intensificar seu sistema de produção animal.

- Convido a todos os interessados a conhecer o BRS Kurumi no campo experimental da UENF.

Rebeca Picanço

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Depois do infarto

Pesquisa da UENF testa terapia com células-tronco para recuperar tecido danificado

Artérias coronárias (foto Wikipedia)
O infarto do miocárdio é o responsável por 400 mil internações por ano no Brasil, gerando um gasto de cerca de 150 milhões de reais. Com foco no tratamento do infarto, a pesquisa de mestrado de Jussara Peters  Scheffer, no âmbito do Programa de Pós-Graduação em  Ciência Animal da UENF,  tem a ambição de tornar possível uma recuperação melhor do paciente pós-infarto, com a recuperação da área lesionada do músculo cardíaco, melhorando assim o prognóstico e recuperação do paciente.

Depois do infarto, a parte atingida do coração cria uma cicatriz que impede esta zona de apresentar uma função normal, o que, de acordo com a área atingida, pode comprometer a qualidade de vida.  A terapia consiste em aplicar células-tronco no local do infarto, permitindo que o coração repare o tecido danificado e, consequentemente, esteja novamente capacitado a desenvolver suas funções. 

Orientado e coorientado respectivamente pelos professores Claudio Baptista de Carvalho e André Lacerda, o estudo já passa por sua fase clínica, ou seja, já estão sendo feitos testes em seres humanos, mas ainda sem resultados definitivos. O que ainda está sendo avaliado é quando a terapia deve ser aplicada: no mesmo dia do infarto, 30 dias depois ou outras opções.

Jussara Peters Scheffer, da UENF
Os dados estão sendo processados com a ajuda de uma equipe de estatísticos do Instituto do Coração de Porto Alegre.

A pesquisa, selecionada para apresentação oral, é uma das 404 apresentadas durante a XII Mostra de Pós-Graduação da UENF, realizada de 15 a 18/10/12, no Centro de Convenções da Universidade. O evento integrou a programação local da IX Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, ao lado da IV Mostra de Extensão IFF-UENF-UFF.

Ana Clara Vetromille

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Coluna Nutrição: Diabetes



 Diabetes: você pode ter e não saber

 Luiz Fernando Miranda e Karla Silva Ferreira*

Em 2011, a Federação Internacional de Diabetes divulgou o último levantamento sobre a quantidade de diabéticos no mundo, mostrando que a doença atinge pelo menos 366 milhões de pessoas. No Brasil, cerca de 10 milhões de pessoas são portadoras da doença e 500 casos surgem a cada dia. O Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, apresenta o maior contingente diabético do país, afetando quase 10% da população. Segundo o Ministério da Saúde, o Diabetes está entre as cinco doenças crônicas não transmissíveis que mais matam no mundo.

Existem principalmente dois tipos de Diabetes: o tipo 1 e o tipo 2. O tipo 1 chama-se Diabetes Mellitus Insulinodependente. Ela ocorre quando o indivíduo não produz insulina em função da doença autoimune. Assim, o próprio organismo destrói células específicas do pâncreas que produzem insulina (células beta). Com a ausência ou baixa produção deste hormônio, a glicose se eleva no sangue. Estes indivíduos, portanto, necessitam de medicamentos e insulina, que também são fornecidos gratuitamente em setores públicos de saúde.

Indivíduos portadores do Diabetes tipo 2, entretanto, produzem insulina normalmente, mas possuem muitas células parcialmente ou totalmente insensíveis ao contato com a insulina, diminuindo a captação de glicose no sangue e, consequentemente, elevando o teor da substância. O Diabetes Mellitus tipo 2 acomete 90 a 95% dos diabéticos e sua causa é multifatorial, influenciada pela inatividade física, excesso de gordura corporal, genética e dieta. Mas qual a importância de controlar o teor de glicose no sangue?

O teor de glicose no sangue não pode ser muito baixo, inferior a 70mg/dL de sangue, pois resulta em hipoglicemia, fraqueza, até coma e morte. E nem alto, frequentemente acima de 126 mg/dL de sangue, resultando em hiperglicemia contínua. Em curto prazo, a constante hiperglicemia, em termos populares, resulta na produção de substâncias que podem prejudicar a visão, a função de proteínas das células do sangue, dos vasos sanguíneos e de receptores de insulina contribuindo para o desenvolvimento do Diabetes. Se o Diabetes não for tratado, os efeitos mencionados acima se agravarão, podendo resultar em doenças oftalmológicas, insuficiência renal, doenças neurológicas, cardiovasculares, acidente vascular periférico e cerebral (AVC) e morte.

Há muitas pessoas que são diabéticas ou pré-diabéticas (glicose no sangue em jejum, regularmente, entre 100 e 125mg/dL de sangue) e não sabem, pois os sintomas podem não ser percebidos pelo doente. Segundo o Ministério da Saúde, em recente diretriz para cuidado aos diabéticos, publicada em setembro de 2012, os principais sintomas clínicos são: perda de peso aparentemente inexplicável, urinar em grande quantidade sem ingestão de muito líquido, além de excessiva sensação de sede. Se você tem estes sintomas, procure um(a) médico(a), de preferência endocrinologista. É preciso investigar bem para diagnosticar corretamente.

E a nutrição, em quê ela pode contribuir para prolongar, melhorar a qualidade de vida dos diabéticos e prevenir a doença? Seguem algumas contribuições:

1.    Além de cuidado médico, os diabéticos devem ter orientação nutricional para elaboração de dietas e monitoramento da glicose no sangue. Ter Diabetes não significa ser proibido de ingerir os alimentos que se deseja, mas sim ter o controle dietético. Os pré-diabéticos e indivíduos não diabéticos com histórico da doença na família devem ter atenção redobrada.

2.    Jamais elimine carboidratos da dieta. Isto independe se você é ou não diabético. Ingerir carboidratos é fundamental à vida!


3.    Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, 61% dos casos da doença ocorrem devido à obesidade! Portanto, evite o consumo de alimentos em excesso e faça exercícios físicos com respaldo médico.

4.    Sempre que possível, ao consumir alimentos ricos em carboidratos, procure ingerir juntamente alimentos ricos em fibras e proteínas, mas com pouca gordura. Exemplo: comer pão ou torrada com creme de ricota ou requeijão light pode ser mais saudável do que comer a torrada ou pão puro. Do ponto de vista técnico, o índice glicêmico da torrada complementada é menor. Outros exemplos mais saudáveis: macarrão com molho “light” e vegetais, pão integral com sementes, arroz com feijão, iogurte light, queijo com goiabada, refeição em geral com vegetais.

5.    Evite a ingestão excessiva de bebidas ricas em sacarose (açúcar), como refrigerantes, refrescos de guaraná adocicados (que não podemos citar o nome) e sucos adoçados.

6.    Um recado àqueles que praticam exercícios físicos (não atletas): não consumir suplementos à base de maltodextrina em excesso (hipercalóricos). A maltodextrina é um carboidrato de rápida absorção, que provoca picos agudos de glicose e insulina no sangue, fato que deve ser evitado para prevenção do Diabetes. Estes produtos foram elaborados para atletas e devem ser ingeridos estrategicamente. Consumi-los sem orientação nutricional pode fazer mal em longo prazo (leia a matéria anterior sobre Suplementos Alimentares, neste mesmo Blog).

7.    Consuma diariamente verduras, legumes e frutas, de preferência in natura. Exemplos de frutas indicadas para os diabéticos: pera inteira, maçã inteira, mamão, morango, kiwi, laranja baía, uva inteira, abacate e acerola.


* Doutorando e professora do Laboratório de Tecnologia de Alimentos (LTA) da UENF

Novo biomaterial pode aperfeiçoar implante de coluna

Imagine se — depois de um acidente ou em virtude de uma hérnia de disco — você tiver que ser submetido a uma cirurgia para a colocação de um implante na coluna vertebral. É possível  repor o osso perdido ou colocar um disco, mas o implante precisa ser trocado de tempos em tempos, certo? Mais ou menos. Esta realidade pode vir a mudar com a pesquisa feita pela mestranda  Zulmira Alice Soares Guimarães, do Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Ciência dos Materiais da UENF.

Orientada pelo professor Marcello Filgueira, do Laboratório de Materiais Avançados (LAMAV) do Centro de Ciência e Tecnologia (CCT) da UENF, Zulmira relata a descoberta de um material com propriedades físico-mecânicas e biológicas que permite a sua aplicação como biomaterial, para fins de implante ósseo tal qual o disco de coluna vertebral.

A pesquisa é uma das apresentadas durante a XII Mostra de Pós-Graduação da UENF, realizada até esta quinta, 18/10, no Centro de Convenções da Universidade, como parte da programação local da IX Semana Nacional de Ciência e Tecnologia.

O novo biomaterial é composto por diamante e titânio. O último é o material correntemente usado para próteses e implantes ósseos. No entanto, o titânio é mais rígido que o osso e possui alto coeficiente de fricção, ou seja, há muito desgaste do material. O diamante é o material conhecido por ter menor coeficiente de atrito e maior biocompatibilidade. As pesquisas mostraram que a combinação dos dois materiais é capaz de produzir um material de  alta longevidade.

Os novos implantes ósseos que venham a ser feitos a partir deste novo biocompósito poderiam trazer melhor qualidade de vida às pessoas que dependem  deles para andar, comer etc. A tecnologia também promete menores custos de fabricação. Os testes foram feitos in vitro e a combinação de materiais não apresentou toxicidade. No entanto, implantes à base deste novo biocompósito ainda não tem previsão para entrar no mercado.

Ana Clara Vetromille



quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Mulheres no Bope

Reprodução - revista Marie Claire
“Tem mulher aí?” Foi a pergunta que Renata de Souza Francisco fez ao Bope por telefone antes de dar início a sua pesquisa de mestrado em Sociologia Política na UENF. E a resposta que ela encontrou foi positiva: são seis integrantes femininas na unidade do Bope do Rio de Janeiro. Três delas são do quadro de combatentes e três do quadro de saúde.

A pesquisa, selecionada para apresentação oral, é uma das cerca de 420 apresentadas durante a XII Mostra de Pós-Graduação da UENF, realizada até esta quinta, 18/10, no Centro de Convenções da Universidade. O evento integra a programação local da IX Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, ao lado da IV Mostra de Extensão IFF-UENF-UFF.

Em pesquisa de campo, a mestranda Renata descobriu que o treinamento para soldados do Bope é de fato como mostra o filme “Tropa de Elite”. Embora sejam oficialmente aceitas, mulheres ainda não marcaram presença no curso.

- São quatro meses de “sofrimento”. O Coesp (Curso de Operações Especiais) sempre começa com turmas abarrotadas, mas poucos são os alunos que concluem o curso – acrescenta a estudante.

Em um batalhão onde a agressividade é uma característica, a pesquisadora tem por objetivo fazer uma analise sobre a participação feminina em profissões que até pouco tempo eram exclusivamente masculinas. A Polícia Militar tem mais de 200 anos, mas mulheres só fazem parte desta história há 30. Foi apenas no fim da ditadura militar que a entrada de mulheres foi permitida. Segundo a pesquisadora, existem vertentes que especulam o ingresso feminino na polícia como uma forma de dissociar a imagem da PM com a ditadura.

- Foi uma tentativa de humanizar a instituição, já que culturalmente a imagem feminina é associada a bondade, beleza, honestidade e docilidade.

Como aluna do mestrado em Sociologia Política da UENF, Renata de Souza Francisco faz visitas semanais ao batalhão. Seus estudos têm a orientação da professora Marinete dos Santos Silva, do Laboratório de Estudos da Sociedade Civil e do Estado (LESCE/CCH/UENF).

Semana de C&T - A programação local da Semana de C&T inclui ainda a IV Mostra de Extensão IFF-UENF-UFF, reunindo trabalhos das três instituições públicas de ensino, pesquisa e extensão. Só a UENF tem mais de 100 projetos cadastrados na Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários. A programação completa da Semana de C&T na UENF pode ser conferida aqui.

Ana Clara Vetromille

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Coluna Um quê de neurociência




Livre-arbítrio: isso existe mesmo?


                                                                                           Arthur Giraldi Guimarães*


Quem comanda a máquina que comanda o corpo humano?
O livre-arbítrio não existe! Sim, é isso que defendem alguns neurocientistas, obviamente fundamentados em importantes evidências científicas. A nossa consciência seria “enganada” pelo cérebro, que daria a ilusão de que as decisões são tomadas por ela. Mas na verdade, ao que parece, quem decide é o cérebro (que, aliás, é também o criador da própria consciência).

Em outras palavras, nossa consciência seria igual à Rainha da Inglaterra: parece que é a soberana e que manda e decide tudo, mas na verdade não manda e nem decide nada! Quem manda mesmo é o cérebro (que na analogia feita seria o Parlamento).

Isso certamente nos obriga a rever e questionar o conceito de “livre-arbítrio”, ou “vontade”. Isso existe mesmo? Naturalmente, este é um tema de altíssima complexidade, e obviamente existe discordância de pontos de vista entre os neurocientistas envolvidos neste tipo de estudo.

A ideia do livre-arbítrio como uma ilusão vem desde estudos clássicos até estudos mais recentes. Um dos maiores defensores da ideia é o neurocientista Michael Gazzaniga, coordenador do Centro para o Estudo da Mente da Universidade da Califórnia, que escreveu recentemente um livro sobre esse tema. Ele e muitos outros decretam o fim do livre-arbítrio baseados nos estudos de mapeamento da atividade cerebral durante o pensamento e a execução de movimentos e tarefas.

Basicamente, eles se apoiam nos resultados dos estudos que mostraram que ocorre atividade cerebral antes da ocorrência da consciência. Os exemplos são vários. Durante uma tarefa em que os voluntários tinham que decidir por apertar um botão, foi demonstrado que a área pré-motora do cérebro (responsável por planejar e coordenar a execução de movimentos) é ativada milissegundos antes da tomada de decisão consciente em apertar o botão.

Mais que isso: num estudo em que voluntários tinham que tomar a decisão de apertar um botão com a mão direita ou com a esquerda, os pesquisadores foram capazes de prever qual seria a decisão tomada pelo voluntário cerca de 7 segundos antes de ele tomar consciência do que fazia (ou seja, antes do ato consciente).

Estes e outros estudos sugerem que a vontade consciente, o sentimento de “querer” algo, ocorre depois, e não antes, da atividade cerebral. Primeiro, o cérebro decide e manda a ordem de execução. Depois, ele cria a consciência do ato, dando a sensação de que foi a consciência que quis e determinou o ato. Daí, portanto, a ideia de que a vontade, o livre-arbítrio, seria meramente uma ilusão, um “floreio” do nosso cérebro.

De fato, outra evidência de que primeiro ocorre a atividade cerebral e depois a sensação de vontade é a observação de que a estimulação elétrica, através de eletródios implantados diretamente na região cerebral de representação motora da mão, induziu pacientes a sentirem vontade de levantar a mão.

O próprio neurocientista Michael Gazzaniga já declarou que nós não precisamos da nossa consciência para tomar decisão alguma. Então, qual seria o papel dela? Lembre-se que a consciência também é fruto da atividade cerebral, mas diferente daquela responsável pela decisão sobre uma ação, tomada pelo cérebro.

É possível que ela sirva apenas para dar coerência e sentido às coisas, uma forma de contextualização das ações, fazendo com que exista uma razão e um sentido para as coisas que nós próprios fazemos e que nos dão a sensação de continuidade do mundo percebido.

Como um assunto denso como esse não poderia deixar de ter visões divergentes, existem pesquisadores que questionam as metodologias usadas nestes estudos sobre mapeamento cerebral. Primeiro, existem críticas no sentido de questionar se as técnicas usadas permitem medir realmente com precisão o tempo (normalmente na ordem de segundos e milissegundos) entre uma atividade cerebral e a execução de um movimento.

Segundo, todas as observações feitas nos estudos podem estar provando apenas que algumas decisões são tomadas pelo cérebro antes da consciência. Mas como são sempre testes particulares e específicos, com alto grau de padronização e simplificação para ter acurácia metodológica, não seriam prova definitiva de que todas as decisões possíveis sejam tomadas apenas de forma inconsciente. A simplificação dos testes não abordaria formas mais complexas de tomada de decisão, que aí sim poderiam perfeitamente necessitar da consciência.

O fato é que, se pararmos para nos autoanalisarmos, veremos que tomamos sim muitas decisões sem “pensar”, inconscientemente e involuntariamente, mesmo que pareça que foi voluntária. Um exemplo pessoal: ontem, antes de terminar de escrever esta coluna, fui à rua de carro. Num sinal com separação de seguir em frente ou virar à esquerda, eu aguardava para virar à esquerda. Então, apenas o sinal de seguir em frente abriu, e o carro que estava na frente começou a andar (ele também pretendia virar à esquerda). Eu, ao ver de relance o sinal verde de “siga em frente” e vendo o carro da frente ir, tomei a decisão de ir também e iniciei o arranque. Segundos (ou milissegundos, nem sei bem!) depois, percebi que a decisão estava errada e que o sinal de meu interesse, o de “vire à esquerda” ainda estava fechado, e então freei o carro e esperei. Bem, a segunda decisão foi aparentemente voluntária e consciente. Mas e a primeira? Essa certamente não foi.

À luz das evidências científicas apresentadas, a primeira decisão, mesmo sendo de alta complexidade e de relevância para a sobrevivência, foi rápida e não deu tempo de passar pela consciência. Depois que as informações chegaram e foram processadas pela consciência, um “tempão” depois, aí sim a segunda decisão pode ter sido tomada de forma consciente. Pelo menos é isso que eu acredito que tenha acontecido com o meu cérebro durante este fato relatado! Mas, também segundo as evidências apresentadas, mesmo a segunda decisão pode ter sido inconsciente, e meu cérebro pode ter criado a ilusão de que foi minha (pobre) consciência que decidiu!

É, a neurociência é mesmo uma destruidora de ilusões! Para aqueles autoconfiantes, seguros da sua capacidade de tomar decisões voluntárias inteligentes e eficazes, cheios de si, sentimos muito em dizer que pode não ser você quem decide as coisas. De certa forma até é você, pois no final das contas cognitivamente você é o seu cérebro, mas pode ser que não seja o “eu consciente” quem esteja à frente das coisas. Toda essa sua empáfia pode ser apenas um “floreio” do seu cérebro.......triste, não?

Bom, essa discussão ainda está de pé e terá muitos e muitos capítulos pela frente!


*Professor do Laboratório de Biologia Celular e Tecidual (LBCT) do Centro de Biociências e Biotecnologia (CBB) da UENF.



SUGESTÃO DE LEITURA:

Leisman G, Machado C, Melillo R, Mualem R. Intentionality and "free-will" from a neurodevelopmental perspective. Front Integr. Neurosci. 2012; 6(36): 1-12.


Gazzaniga, Michael S. Who's in Charge? Free Will and the Science of the Brain. 1ª Ed. Ecco / HarperCollins, 2011.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Campanhas eleitorais: quem paga a conta?

Mais controle: escândalos trazem mais cautela aos doadores
Será que sabemos a origem e o destino de todo o dinheiro usado em campanhas eleitorais? Na tese de doutorado de Vitor Peixoto, hoje professor do CCH/UENF, foram analisados sistemas de financiamento de campanhas em 94 países considerados democráticos. O Brasil figurou entre os países que mais regulam a competição eleitoral.

De acordo com o pesquisador, que se doutorou pelo antigo Iuperj (atual Iesp/Uerj), toda regulação do Estado é uma forma de intervir na competição política.

— No Brasil, os partidos e candidatos atuam num mercado altamente regulado, principalmente no que concerne ao financiamento das campanhas. Por um lado, o Estado atua direta ou indiretamente como fomentador financeiro dos partidos; por outro lado, impõe uma série de proibições à participação privada de atores tais como sindicatos e empresas concessionárias de serviços públicos — disse.

O fomento financeiro aos partidos feito diretamente é o repasse em dinheiro conhecido como fundo partidário. Embora o repasse seja realizado no período entre as eleições, os recursos são utilizados para obter votos – que, segundo Vitor, é por definição o objetivo de qualquer partido político.

— Já os recursos indiretos são, por exemplo, o acesso à mídia distribuído aos partidos como o horário eleitoral gratuito. Porém a gratuidade é somente aos partidos, dado que as emissoras são ressarcidas com isenções de impostos, ou seja, o horário é pago centavo a centavo pelos cidadãos brasileiros. Todos esses recursos fazem parte do que chamamos de custo da democracia. Toda democracia tem um custo, mas é um custo sempre menor do que uma ditadura — explicou.

No Congresso há várias propostas de um sistema exclusivamente público de campanha, ou seja, proibição total de participação privada nas eleições. Para Vitor, isto é uma temeridade, posto que não existe experimento democrático no mundo com tal sistema.

— Essa proposta ignora que a doação de campanha é uma importante forma de participação política do cidadão. O que precisa ser revisto no sistema brasileiro é o limite à doação, que hoje é relativo ao percentual auferido no ano anterior às eleições. O limite é de 2% no caso de pessoas jurídicas e de 10% para pessoas físicas. Ou seja, um megaempresário tem mais direito do que outro mortal qualquer. Outro ponto é o limite de arrecadação dos partidos, posto que é o próprio partido que diz o quanto poderá arrecadar naquela eleição — afirmou.

Diante do atual e polêmico julgamento do mensalão, Vitor Peixoto diz que a própria existência do escândalo provocou mudança de comportamento de atores políticos, principalmente as empresas. Segundo o professor, antes do caso era comum haver doações fora do sistema formal, conhecidas por “caixa 2”, para se proteger de possíveis reprimendas em caso de vitória dos adversários. Após as denúncias em 2004, e o consequente aumento da fiscalização tanto dos órgãos fiscalizadores como da imprensa, aumentaram muito os riscos de escândalos, e as empresas passaram a ter muito mais cuidado com as doações. Sinal disto, afirma Vitor, é que o número de empresas que fazem doações registradas é dez vezes maior em 2010 do que em 2002.

— Posso afirmar com segurança que hoje o sistema de fiscalização está muito mais sofisticado do que há dez anos, principalmente após o acordo entre a Receita Federal e o Tribunal Superior Eleitoral, que prevê o cruzamento de dados dos doadores e dos partidos. Enfim, sempre será uma corrida de gato e rato. Não obstante o tamanho do desafio, a democracia brasileira está no caminho correto de aperfeiçoamento do sistema — opinou Vitor.

Thaís Peixoto

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Coluna Nutrição




Suplementos alimentares


Luiz Fernando Miranda e Karla Silva Ferreira*

A indústria de suplementos alimentares fatura anualmente mais de 180 bilhões de dólares no mundo com a venda de produtos, que teoricamente, deveriam ser consumidos por atletas. Porém, os frequentadores de academias e até mesmo indivíduos sedentários se tornaram adeptos destes produtos.

Segundo a Associação Brasileira de Academias, o Brasil é o segundo maior mercado de academias de ginástica do mundo, que pode ser justificado, principalmente pela busca à estética, que também é um forte estímulo ao consumo de suplementos.

Atualmente, os tipos de suplementos mais vendidos no Brasil são os destinados a aumento de massa muscular, emagrecimento e funcionais, respectivamente (Veja Quadro). 

No Brasil, a fabricação e comercialização destes produtos são regulamentadas pelo Ministério da Saúde por meio da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Alguns deles são fiscalizados também pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Embora o termo suplemento seja utilizado na venda de produtos alimentares para fins estéticos e de saúde, a Anvisa só reconhece como suplemento aqueles destinados para atletas e produtos vitamínicos e minerais.

Muitos suplementos, se utilizados de forma estratégica, são benéficos à saúde e têm  efeito positivo no ganho de massa muscular e desempenho físico, por exemplo. Entretanto, muitos fabricantes põem em dúvida a seriedade do produto pelo excesso de propaganda de efeitos sem comprovação para alavancar as vendas.

Desconfie dos produtos que têm efeito laxante, tiram o sono, provocam ondas de calor, hipertrofiam demais os músculos e em curto prazo — os nutrientes em si não provocam estes efeitos, que podem ser causados por componentes proibidos em alimentos pela Anvisa, como sibutramina, extrato de tribulus terrestris, laxantes, efedrina, dimetil-amilamine e até esteróides anabolizantes.

Outro ponto que o consumidor deve ficar atento refere-se às sugestões de consumo declarado nos rótulos dos suplementos (Figura). Na figura, o fabricante recomenda quantidade excessiva de carboidrato para ser diluído em um copo de leite ou água.

Figura: sugestão de consumo declarado pelo fabricante no rótulo de um suplemento a base de carboidrato

Geralmente as quantidades sugeridas, como estas, excedem as necessidades das pessoas, e o consumo indiscriminado pode ser danoso. Pessoas que não sabem que são diabéticas ou pré-diabéticas, por exemplo, podem agravar a doença ou mesmo se tornarem diabéticas com o consumo excessivo de hipercalóricos. Estes produtos possuem quantidades elevadíssimas de açúcar de alto índice glicêmico.
       
Em suma, a suplementação pode trazer benefícios, mas antes de consumir procure ajuda de nutricionistas, de preferência com especialidade em nutrição esportiva. Ele(a) saberá avaliar sua real necessidade nutricional e, se for o caso, indicará o suplemento correto.
             

*Luiz Fernando Miranda é doutorando e Karla Silva Ferreira é professora do Laboratório de Tecnologia de Alimentos (LTA) da UENF.

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Camarões do Farol são menores que os de Atafona

Pesquisa da UENF mostra existência de dois grupos distintos de camarão sete barbas no litoral leste do país, entre Campos (RJ) e Caravelas (BA)

Apenas alguns quilômetros separam as praias de Atafona (São João da Barra-RJ) e Farol de São Tomé (Campos dos Goytacazes-RJ), no Norte Fluminense. Mas, segundo cientistas da UENF, os camarões da espécie sete barbas que vivem no mar do Farol de São Tomé são morfologicamente distintos dos camarões da mesma espécie que povoam o mar de Atafona. É o que aponta a pesquisa feita pelo biólogo Fábio Bissaro no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Recursos Naturais da UENF, sob coordenação da professora Ana Paula Madeira Di Beneditto, do Laboratório de Ciências Ambientais (LCA).

A pesquisa teve por objetivo identificar os estoques pesqueiros do camarão sete barbas ao longo da costa leste do país, a partir da variação de forma de seu cefalotórax (região anterior do corpo dos crustáceos, que compreende a cabeça e o tórax juntos). A hipótese — confirmada durante a pesquisa — era a de que as diferenças ambientais (como temperatura da água, salinidade e tipo de sedimento) poderiam influenciar na diferenciação morfológica entre grupos populacionais da espécie, formando distintos estoques pesqueiros. As áreas escolhidas foram Caravelas (BA), Vitória (ES), Atafona e Farol.

— Verificamos a existência de dois grupos distintos da mesma espécie entre as áreas de coleta. Os camarões coletados nos portos de Caravelas, Vitória e Atafona (maiores), que sofrem influência permanente dos aportes de água doce e se associam a substrato arenoso-lodoso, formaram um grupo distinto em relação aos indivíduos coletados em Farol, área que não tem esse tipo de influência e que apresenta substrato arenoso, temperatura média da água mais baixa e salinidade mais elevada.  — explica Bissaro.

Segundo ele, a pesquisa pode ajudar a criar formas mais sustentáveis para a comercialização do camarão, bem como estabelecer períodos de defeso específicos para cada região. Para tanto, acrescenta, é necessário reconhecer os estoques existentes e a forma como se distribuem, promovendo um melhor entendimento sobre os impactos da pressão pesqueira.

— Estudos sobre essa espécie são considerados prioridade para o governo brasileiro, devido à sua importância como recurso pesqueiro. É importante que haja outros estudos dessa natureza ao longo de outras áreas de distribuição e exploração comercial da espécie, para a aplicação de políticas pesqueiras que mantenham a sua sustentabilidade — afirma.

O camarão sete barbas é a espécie mais representativa dentre os crustáceos explorados pela pesca artesanal marinha no país. A produção anual da espécie na costa leste do Brasil é estimada em cerca de 5 mil toneladas, o que representa 42% da produção total da pesca direcionada a crustáceos marinhos.

Em 1984, o governo implantou a política do defeso, proibindo a pesca dos camarões rosa em mar aberto, do Espírito Santo até o Rio Grande do Sul, durante meados do verão e final do outono. Desde 2008 está em vigor a política atual do defeso, que vale para várias espécies de camarão que se distribuem no sul e sudeste do país — incluindo o sete barbas.


Fúlvia D'Alessandri