quinta-feira, 7 de março de 2013

O Dia Internacional da Mulher: o que podemos comemorar?


Marinete dos Santos Silva*


Professora Marinete dos Santos Silva
Nos últimos anos, o Dia Internacional da Mulher popularizou-se de tal maneira que uma rede de lojas bastante conhecida em nosso país instituiu no mês de março a “semana da mulher”. As emissoras de TV em anúncios bastante ruidosos mostram as ofertas de lingerie, produtos de higiene pessoal e beleza dedicados a ela e oferecidos a preços teoricamente mais baixos. Nas empresas é bastante comum o oferecimento de rosas às mulheres como forma de homenageá-las pelo seu dia. Na grande mídia escrita — os principais jornais do país e as revistas semanais — não raro aparecem matérias onde mulheres de sucesso, com carreiras sedimentadas, abandonam o trabalho para se dedicarem ao marido e aos filhos renunciando, portanto, à independência financeira e à realização pessoal.

Essas demonstrações têm um ponto em comum: estão anexadas em uma visão de que o Dia Internacional da Mulher foi criado para homenageá-la exaltando os seus papéis tradicionais de dona-de-casa, esposa, mãe e grande sedutora. Nunca são mostradas mulheres com carreiras de êxito e que, mesmo diante de todas as dificuldades, perseveraram e muito menos os índices alarmantes da violência perpetrada contra elas.

Quando essa comemoração foi instituída pensou-se justamente em um dia onde as pessoas pudessem parar e refletir sobre a situação de metade da humanidade. Pensou-se principalmente em levar às pessoas uma questão fundamental: por que chegamos aos dias atuais com tantos avanços tecnológicos, avanços científicos nos mais variados campos, mas, apesar disso, ainda persistem grandes desigualdades entre homens e mulheres? Muitas pessoas poderiam contestar essa afirmativa dizendo simplesmente que temos uma presidenta da república, temos reitoras nas universidades públicas, deputadas, senadoras, prefeitas etc.

O fato de termos algumas mulheres em cargos decisórios não significa, entretanto, que as desigualdades tenham sido suplantadas. A maioria ainda patina em trabalhos mal remunerados e sem a mínima consideração social. Mesmo em cargos especializados, as mulheres ainda recebem em média 30% a menos que os homens.

As desigualdades econômicas entre homens e mulheres já foram aferidas por agências respeitáveis como a ONU, o IBGE, o IPEA, mas é ainda a questão da violência o que mais choca dentro desse quadro de assimetria de poderes. Em recente entrevista, o Secretário Geral da ONU revelou que a violência contra a mulher tornou-se na atualidade uma pandemia, afetando todos os países em níveis alarmantes. No Brasil, dados do Ministério da Saúde mostram que o número de mulheres assassinadas cresceu 217,6% nos últimos trinta anos. Entre 1980 e 2010, foram assassinadas 91.932 mulheres. Somente na última década, foram registradas 43.486 mortes. Se pensarmos que os Estados Unidos perderam na guerra do Vietnan 40.000 soldados poderemos ter a exata medida da tragédia que se abate sobre nós.

Poder-se-ia perguntar a essa altura: para que serve a Lei Maria da Penha, em vigência desde 2007? Imaginava-se que ela viria modificar esse quadro, preservando a integridade física das mulheres. Sua eficácia, entretanto, mostra-se bastante reduzida quando os operadores da lei não possuem treinamento adequado para atender as ocorrências, não decretando a prisão dos agressores ou não cumprindo mandados que garantissem a vida daquelas que ousam registrar queixas nas Delegacias Especializadas. Vale ressaltar que uma simples lei não muda um quadro cultural em que o homem se sente proprietário da mulher e que se acha com direitos sobre o seu corpo e a sua vontade, não aceitando o fim de um relacionamento quando a iniciativa é tomada por ela. A questão é mais profunda e se insere no quadro de desigualdades falado anteriormente.

O que podemos fazer para mudar essa dolorosa realidade? As discussões sobre ela nos remetem ao chamado “empoderamento” das mulheres. Esse termo foi criado para mostrar a necessidade de elas compartilharem o poder com os homens em todas as esferas, mudando dessa forma a correlação de forças não apenas no sentido político tradicional, mas igualmente no âmbito privado. “Empoderar” as mulheres é fazê-las capazes de decidir sobre seu corpo, seu trabalho, sua sexualidade. Essa luta não pode ser travada apenas pelas mulheres em seus coletivos de discussão. Ela é uma luta de todo o povo brasileiro: homens e mulheres. Nossos parceiros não podem ser nossos carrascos. Seria bom se esse 08 de março de 2013 pudesse ser um dia não apenas de comemorações frívolas, mas de reflexão para a vida e a felicidade de todos nós.

*Professora do Laboratório de Estudos da Sociedade Civil e do Estado (LESCE) do Centro de Ciências do Homem (CCH) da UENF.   


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